Manifesto Lidimista
Versão: 1.2.0 - Última Atualização em 25/03/2024
- A arte sempre será filha de sua época, uma filha que sempre nascerá — independentemente do desejo da época — e que poderá tomar qualquer forma e qualquer mídia, desde os tradicionais pincéis e cinzéis até as ondas digitais da era moderna. Uma filha que carrega nas suas entranhas a marca inconfundível desse seu tempo de origem, atuando como um espelho complexo que reflete as vicissitudes, as esperanças e as neuroses da era que a viu nascer. Mas essa natureza camaleônica da arte, embora seja fonte de sua riqueza e vitalidade, carrega consigo um risco mortal: o risco de ser cooptada, diluída e, finalmente, domesticada pelas forças predatórias da comercialização e do entretenimento superficial. Logo, sem a educação correta, ela poderá se perder no tempo, sendo engolida por alguma rede social — ou projeto de propaganda publicitária — e expelida de volta em forma de entretenimento barato, fragmentador de mentes. Entretenimento reforçador, em sua essência simplista; um narcótico digital que aliena mentes e, por extensão, sociedades, cumprindo a função de uma anestesia cultural que embala o público em uma letargia complacente, enquanto os mecanismos do poder — sempre ávidos por controlar e consumir — avançam sorrateiramente, como água que se infiltra silenciosamente em cada poro da pele.
- A história está repleta de exemplos onde a arte serviu como um bastião contra a opressão, um grito de resistência que ressoa através dos séculos. Pensemos na “Guernica” de Picasso, um poderoso testemunho contra os horrores da guerra civil espanhola, ou nas obras de Tarsila do Amaral, que capturam a essência de uma identidade cultural brasileira, lutando contra a maré da homogeneização cultural. Esses exemplos ilustram a capacidade transcendental da arte de se elevar acima do mero entretenimento, transformando-se em um instrumento de crítica social, uma arma na luta contra as forças destrutivas do conformismo e do consumismo.
- Para a arte continuar a cumprir esse papel vital, é imperativo haver uma reavaliação radical da maneira como ela é percebida e valorizada na sociedade contemporânea. Precisamos mudar como ensinamos arte, ensinando técnicas e métodos. Precisamos respeitar a arte como uma forma de expressão que nos faz questionar, desafiar e mudar. Só então poderemos esperar que a arte mantenha sua posição como uma força de resistência contra a cultura de massa e do consumismo, servindo como um farol de esperança e humanidade em um mundo cada vez mais esmigalhado e doente.
- Nesta era digital sombria, somos testemunhas e vítimas de uma alquimia nefasta que molda o tecido da realidade a seu bel-prazer. Alquimistas digitais, com destreza e malícia, tecem desinformação, espalhando-a pelas redes sociais como uma peste voraz que devasta campos já debilitados pelo descaso e pela manipulação. Seus discípulos, tanto cúmplices quanto inocentes propagadores dessa peste, carregam adiante o veneno, assegurando que nenhum canto, por mais protegido que pareça, fique intocado por essa infestação que molda percepções e, por sua vez, o futuro; é como numa pandemia.
- Este ataque coordenado contra a verdade tem consequências devastadoras: pavimenta o caminho para regimes autoritários, agrava crises ambientais e socioeconômicas, e concentra poder e riqueza nas mãos de poucos indivíduos e corporações, perpetuando desigualdades e injustiças. Neste cenário distópico, a realidade é não mais do que uma ilusão fabricada, uma miragem criada para entreter, distrair e dominar.
- Algumas pessoas reagem à anestesia antes de serem dominadas pela apatia, mas nem todos são assim, nem todos estão presentes no presente e atentos ao entorno da mesma maneira como fazemos em nossas ruas violentas. Diante desse assalto incessante à realidade, emerge uma depressão coletiva, um desespero que permeia as almas daqueles presos na engrenagem desse sistema. Cada dia torna-se um reflexo turvo do anterior, um ciclo de automatismo onde a vida é vivida sem presença, sem profundidade, um mero existir sem viver verdadeiramente. A originalidade do ser é sugada, deixando para trás apenas um avatar, uma casca de existência que segue rotinas predeterminadas até a morte. São distrações e distrações cada vez mais inúteis e o desejo de produzir — pelas razões erradas — cresce junto da falta de visão colaborativa com o restante da sociedade. Eis a primeira depressão.
- Vem então a adoção de verdades fabricadas, na escolha de viver numa realidade alternativa, longe da verdade factual e da autenticidade. As pessoas — já fadadas à escravidão implícita nas rotinas diárias em busca de proventos — escolhem sua musa; um ser justificador e acalentador para a vida kafkiana que passaram a viver, um deus, ou deuses, que possa ser alvo de pedidos de cura e salvação que extraem de si a responsabilidade pelos ocorridos. Cresce então o espetáculo negacionista e ignorante. Neste palco, os indivíduos rejeitam a ciência, abraçam teorias da conspiração e pseudo conhecimentos, trocando a integridade intelectual por confortos ilusórios. Bertrand Russell, décadas atrás, já advertia sobre o perigo de acreditar em algo não por sua veracidade, mas por sua conveniência. O preço dessa traição à própria essência é a perda da liberdade, da capacidade de questionar e de participar ativamente na construção de um futuro melhor. Eis a segunda depressão.
- Para romper com essas cadeias de manipulação, é crucial uma reafirmação coletiva da verdade, da razão e do ceticismo. Precisamos reconhecer e resistir à alquimia digital que ameaça nossa percepção da realidade, buscando a autenticidade e a responsabilidade na forma como vivemos e interagimos com o mundo ao nosso redor. Só então poderemos aspirar a uma sociedade mais justa, equitativa e verdadeiramente livre. Do contrário, quais são os sacrifícios em nome de uma venda que amarramos nos próprios olhos?
- Desde muito tempo, a moralidade racional tem sido sistematicamente desafiada por instituições religiosas e movimentos extremistas. No contexto atual, esse embate atinge um ápice perigoso, onde a distância para um ponto de não retorno parece estar se encurtando. Observamos uma sociedade que, em uma tentativa desesperada de afirmar sua individualidade, opta por uma cegueira voluntária, abraçando verdades alternativas em detrimento de fatos históricos e científicos comprovados. Tudo o que contradiz suas crendices folclóricas pessoais é abandonado. Pensam dispensar as vendas, mas arrancam os próprios olhos e gritam por atenção; por suas próprias verdades; alheias aos passos que dão. Esse abandono da razão transforma a expressão humana em uma mera sombra fútil, relegando as artes — que deveriam atuar como espelhos e críticos da sociedade — a papéis superficiais e estéreis.
- Nesta busca frenética por gratificação instantânea, prazer e riqueza, perpetrada sob o olhar complacente de reforçadores comportamentais, a existência humana se degrada em uma luta constante contra a apatia, uma batalha que muitos já parecem ter perdido. O ambiente não permite mudanças fáceis e a vida passa tão rápido quanto se deseja que a felicidade chegue. O espírito humano, em seu estado mais apático, não passa de um zumbi na marcha implacável do capitalismo de Estado, configurando a “terceira depressão”. A arte, nesse cenário, perde seu propósito e se transforma em uma mercadoria vazia, um jogo de especulação financeira distante de seu verdadeiro papel comunicativo. Um produto distribuído às centenas pelo mundo, em reproduções vendidas na rede por pseudofamosos ou expostas em galerias de milionários, sempre com o único intuito de obter lucro; deixando o importante papel de comunicar o incomunicável relegado a outro plano qualquer da obra de artistas que não conseguem destaque.
- Diante dessa paisagem desoladora, a arte enfrenta o desafio de resistir à pressão do egoísmo, do mau gosto e da desvalorização impostos pela era contemporânea; um mundo habitado pela ignorância e suas depressões. Os artistas, embora deslocados neste teatro de absurdos, não devem ceder às forças que demandam sua submissão. No entanto, o dilema persiste: a necessidade de sobrevivência muitas vezes obriga a criatividade a se dobrar a trabalhos alienantes, consumindo o espaço necessário para a livre expressão. Ora, as depressões são frutos do próprio Estado, são uma forma do capitalismo se manter nesses períodos finais de vida.
- A tecnologia, paradoxalmente, oferece uma oportunidade para os artistas transcenderem essas limitações, permitindo-lhes levar suas “galerias” diretamente ao público. Contudo, essa mesma tecnologia também desnuda falhas profundas na nossa evolução social. Sob o domínio das redes sociais, a busca pelo progresso intelectual é frequentemente substituída por uma corrida desenfreada em direção à fama e ao reconhecimento superficial. Esse sistema valoriza números vazios — engajamento, seguidores, visualizações — em detrimento da qualidade e da originalidade. Assim, a arte arrisca ser reduzida a meras repetições de estéticas passadas, em uma tentativa vã de capturar um reconhecimento que foi válido em outros contextos históricos e culturais. Os artistas se veem presos em uma imitação desesperada de técnicas, materiais e ideias dos grandes mestres, na esperança de serem reconhecidos como autoridades em um campo cada vez mais saturado de apatia estética. Vendem-se em uma entrega perturbada a estéticas validadas no passado, com objetivo de conquistar reconhecimento similar em épocas diferentes da que vivemos agora. E dizem que arte digital não é arte verdadeira? Esses alimentam o desejo de se sentirem, por exemplo, um mestre renascentista, um expressionista ou academicista de outrora, apenas para mostrar supostas habilidades e autoridade usando bases que já são conhecidas e de fácil acesso. O artista que se sente deslocado não deve se entregar à vontade dos que querem a sua entrega, por mais difícil que seja tal tarefa. O artista não deveria precisar vender, dentro de seus pensamentos diários, o espaço de sua criatividade a trabalhos que servem apenas ao propósito do bem-estar básico, da sobrevivência; trabalhos realizados de maneira quase irracional. O artista precisa desse espaço para si, precisa ter essa escolha como alternativa real e, se não a tem, que possa possuir uma ferramenta para comunicar tais ideias nos meios menos esperados e obter seus recursos de sobrevivência da mesma forma.
- Essa crise na arte reflete uma crise mais ampla na sociedade — uma luta contra as forças de desumanização trazidas pelo capitalismo tardio, que se alimenta da nossa incapacidade coletiva de imaginar e lutar por um mundo onde a arte e a expressão humana possam florescer livremente. A resistência a essa tendência deve começar com uma reavaliação profunda dos valores que sustentam nossa sociedade e com um compromisso renovado com a arte como um meio vital de crítica, comunicação e, acima de tudo, como um ato de resistência contra a esterilização da experiência humana.
- A arte, como signo de comunicação profunda, deve reagir, deve acompanhar o progresso das eras, deve ultrapassá-lo e, quando essa era deixar-se refrear, deve puxá-la, provocá-la. Figuras históricas revolucionárias como Lenin compreenderam a importância de uma teoria estruturante para catalisar mudanças radicais. Essa teoria deve ser um instrumento de comunicação universal, capaz de atravessar as barreiras que separam um acadêmico trancado em uma universidade de arte de um trabalhador diário, lutando pela sobrevivência.
- Com base nessa premissa, proponho uma análise que transcenda o visível, adentrando os domínios do invisível por meio de uma reflexão cética, sem precisarmos abandonar, como Clive Bell definiu como forma significante, a beleza ou a feiura. Através dessa introspecção, é possível alcançar uma arte analítica e inferencial, que encapsula tanto a experiência comum quanto as visões únicas do artista. Este movimento se distancia tanto do realismo, que se limita ao tangível, quanto do surrealismo, que se perde na abstração do subconsciente, buscando uma nova forma de expressão que englobe a complexidade da experiência humana e faz a geração atual fugir de reflexões necessárias à sua própria sobrevivência. Assim como a sobrevivência de criaturas que não podem fazer as próprias escolhas.
- A arte comunica — mesmo nos holofotes com a debilidade da arte comercial — e quando falamos de comunicação, de linguagem, falamos do mediador entre a realidade e nossa mente; a realidade só existe em nós através da linguagem. Traduções sempre serão versões do original, nunca expressarão precisamente o mesmo e suas pequenas nuances. Conceitos se perdem e sensações não encontram mais formas em nossa voz interior na ausência da linguagem ideal. Nossa pátria é a nossa língua, disse Fernando Pessoa. Habitamos nossa língua e, por meio da arte, podemos compartilhar uma pátria com o mundo, uma língua em comum, uma cultura em comum, que já se iniciou com o advento da internet. A Arte Lidimista aspira a ser essa linguagem universal que John Dewey vislumbrava, resistindo à trivialidade e buscando um significado mais profundo. A Arte Lidimista, portanto, não se contenta com a representação superficial do mundo natural; ela tem em vista revelar o que jaz além do evidente, utilizando a metáfora para desvelar verdades mais profundas. Este movimento reconhece a limitação dos nossos sentidos e a complexidade inerente à realidade, inspirando-se na filosofia de Pirro de Élis para expressar uma compreensão da realidade que vai além da superfície, sem cair na armadilha do dogmatismo ou do julgamento emocional. É tolo deixar essa linguagem abandonada às futilidades sem valor e razão.
- Em concordância com o que acreditamos todos, o nome designado para o novo modo de expressão à disposição é LIDIMISMO, palavra que deve ser entendida de maneira particular. Define-se:
- LIDIMISMO. s.m. 1 - Ceticismo em busca do entendimento da verdade, pelo qual se tem em vista exprimir musicalmente, por escrito, por meio de pinturas, tatuagens — e quaisquer outros meios criativos — a realidade, compartilhando espaço com inferências analisadas pelo artista; 2 - Aplicada às coisas que podemos enxergar e as que só podemos imaginar e expressar de maneira alegórica; 3 - A expressão de um entendimento em caráter quase simbólico; expondo uma realidade surrealizada por toda sua profundidade simbólica; 4 - Movimento artístico-analítico atemporal, com similaridades estéticas com outros movimentos, como o Naturalista, o Surrealista, o Minimalista e o Expressionista.
- A arte é uma filosofia que nos ajuda no entendimento da experiência humana por meio de sua representação. O mundo natural está ultrapassado para as artes; ele ainda pode ser capturado por pinturas, música ou precisamente por fotografias, mas pouco diz sobre o mostrado, pouco aprofunda sem a ajuda de mais ferramentas. A arte que surge de uma perspectiva cansada pode ser tão emotiva quanto uma capa de um livro fechado. O autêntico mundo natural é subentendido em nosso tempo e, talvez, assim continue no futuro. Ele não pode ser visto apenas com o que os olhos mostram em um primeiro momento. Ele precisa da leitura do tal livro hipotético, ele é dinâmico. O movimento Lidimista retrata o que sua etimologia, de lídimo, nos ensina: o que é admitido como legítimo, verdadeiro, autêntico, genuíno em todas as suas representações. E, para isto, o olhar deve ser para o que vemos além da superficialidade do que nossos mesmos olhos nos mostram do mundo, mesmo que essa representação necessite de irrealidades que expliquem o real de maneira metafórica; os olhos da mente devem ser mais usados que os olhos do rosto. Como Pirro de Élis, precisamos saber que, no mundo das aparências, é impossível se obter conhecimento seguro diretamente da realidade, da natureza absoluta, inegavelmente incompreensível aos seres humanos. Devemos, então, expressar — mesmo se não for possível saber como as coisas são de fato — sem julgamentos, racionalmente, sem ser levado por emoções e desejos pessoais. Após profunda análise do que inferimos e sentimos em relação a elas, expressar como as coisas nos parecem em toda sua completude, além da realidade que podemos ver. Podemos simbolizar a visão e o raciocínio, mas devemos fazer isso pensando na pessoa comum, no trabalhador, o qual é o mestre da análise dessa arte e deve conseguir compreendê-la ao menos ao nível inicial de interesse. Eis o Lidimismo, ao lado da imaginação e das emoções das pessoas, convidando-as a utilizar ambas. O Lidimismo é um convite à reflexão e à imaginação, um chamado para cada indivíduo explorar as profundezas da sua própria percepção e experiência. Este movimento não é apenas uma nova forma de arte, mas uma nova maneira de ver e entender o mundo, uma tentativa de capturar a autenticidade e a verdade em todas as suas formas. É um manifesto contra a superficialidade, um grito de guerra pela profundidade de pensamento e expressão, um apelo para olharmos além do óbvio e encontrarmos a beleza e o significado nas camadas ocultas da existência.
- O ceticismo e a racionalidade, frequentemente mal interpretados como inibidores da criatividade, na verdade, são catalisadores essenciais para uma expressão artística genuinamente profunda e livre. Eles fornecem um terreno fértil onde a interpretação e a expressão não apenas coexistem, mas florescem juntas, ligando o abismo entre o complexo e o compreensível com elegância singular. Longe de serem obstáculos, são as chaves que desbloqueiam novos domínios do pensamento e da percepção.
- Na arte, a estética não é um limite, mas um portal para a comunicação de ideias que residem além do alcance do ordinário. Luz e sombra, por exemplo, transcendem a mera função de embelezar ou ilustrar um tema; elas se tornam entidades vivas, capazes de invocar realidades além da nossa existência cotidiana. A arte, nesse sentido, torna-se um veículo para explorar não só o que é, mas o que pode ser, empregando o mundo mundano como uma fonte de inspiração para revelações extraordinárias sem deixar de expressar conceitos de forma.
- As coisas vistas podem não ser possíveis de serem representadas na forma de realidade ordinária, pois assim é na realidade ordinária. Na arte, a própria realidade ordinária é lida pelo artista em busca de informação, dos tempos passado e futuro do tema escolhido, para ser expressa em linguagem, em realidade extraordinária, expressa de maneira menos óbvia, de maneira esteticamente irreal, estimulando o pensamento antes esquecido ou deixado em segundo plano. Mais uma vez, os olhos da mente racional são mais usados do que os olhos para o mundo supostamente real de verdades fabricadas.
- Ainda assim, como fotos expressam a psicologia do olhar e, ao absorverem a luz, substituem a necessidade do realismo das pinturas. O Lidimismo se apropria do bizarro, do real, reimaginando-os em novas formas que ressoam com significados mais profundos. Essa abordagem não busca meramente decorar ou entreter; cada escolha estética é deliberada, destinada a comunicar, a provocar reflexão. O lidimista atua como um intérprete sagaz, mais do que como um tradutor, revelando camadas de significado que podem passar despercebidas ao observador desatento.
- Nesta era de deslumbramento tecnológico, a humanidade se distrai com a ilusão de ser o eixo central da existência, negligenciando a verdade de sua insignificância cósmica. A arte consegue desafiar essa noção, de expor a superficialidade do automatismo que permeia tanto o pensamento quanto a ação contemporâneos. A crítica feita pelo Lidimismo se estende à produção literária inflada e à música mercantilizada, ambos sintomas de uma era obcecada por conteúdo efêmero e desprovido de substância. Em um mundo saturado por informações dispensáveis, o Lidimismo se posiciona contra a trivialidade, promovendo uma arte que busca transcendência e propósito.
- O valor do texto não reside em sua extensão, mas na relevância e profundidade de seu conteúdo. Escritores que inflam suas obras com palavras vazias perpetuam o ciclo de distração e desengajamento. Da mesma forma, a música, essa forma de expressão universal, não deve se render às garras do capitalismo, que prioriza a produção de obras descartáveis voltadas para o consumo passivo e o lucro rápido. O Lidimismo rejeita tais expressões artísticas empobrecidas, aspirando a uma arte que enriquece, desafia e eleva o espírito humano.
- Portanto, o Lidimismo não é apenas um movimento artístico; é um chamado para a reconexão com o autêntico, um manifesto contra a mediocridade e a complacência. Ele nos convida a explorar o vasto território do possível, a repensar nossa relação com a arte, a cultura e a sociedade. Em uma época de superficialidade e dispersão, o Lidimismo se ergue como um farol de profundidade, significado e resistência intelectual.
- O objetivo do Lidimismo, ao refletir sobre o tecido da arte contemporânea, necessita de uma compreensão profunda de seus antecessores e das correntes que moldaram o cenário artístico até agora. No Realismo, observamos a representação nua e crua da interação humana com seu ambiente social, uma busca pela verdade sem adornos, pela análise crítica da condição burguesa. O Naturalismo, por sua vez, intensifica essa visão, expondo de maneira ainda mais crua e visceral a natureza humana como um produto direto de seu meio, mergulhando nas profundezas da realidade para escavar as camadas de podridão subjacentes.
- Ainda no século XX, surgiu o Surrealismo, com seu olhar voltado para o subconsciente e o onírico, propõe um desvio radical, materializando cenas que desafiam a lógica ordinária, criando um universo anárquico de possibilidades infinitas. Nesse panorama, o Lidimismo emerge como um elo evolutivo, sintetizando a crueza do Naturalismo com a liberdade surrealista, reconhecendo o indivíduo não apenas como produto de seu meio social, mas também como um ser reconfigurado pelo Estado, pelos algoritmos e pela manipulação midiática. O Lidimismo, portanto, tem em vista expressar uma realidade social cuja subjetividade exige uma estética ampliada, uma realidade que transcende a mera observação para abraçar a extrapolação, o movimento, a sonoridade e a intensidade. O Lidimismo é o próximo degrau, como um filho Naturalista-Surrealista, pois o homem ainda é produto do meio social, mas é um produto criado de maneira mais intensa, manipulada pelo Estado e por algoritmos em redes sociais e ferramentas de busca. A subjetividade da realidade social pede uma estética mais irreal para ser representada de maneira verdadeiramente realista — além da palavra. A nova realidade não estaciona apenas nos olhos e, definitivamente, não é verdadeira no profundo dos pensamentos subconscientes; ela é extrapolação, movimento, som e fúria, tudo que a torna não-vazia de razão para existir. Mesmo que o artista opte por não revelar suas razões, preferindo deixar para o público o quebra-cabeça a ser montado; isso porque sabe que a revelação ainda deixaria espaços para a análise — entender a arte seria como entender outra pessoa, além do artista — a arte ainda seria acessível inicialmente com todas essas considerações.
- Este movimento não se contenta em revelar suas intenções abertamente; prefere envolver o público em um processo ativo de descoberta, consciente de que mesmo a mais completa das revelações deixará margem para interpretação. Como poderíamos, afinal, condensar a complexidade de um ser humano e de suas experiências em uma linguagem simples, sem recorrer ao auxílio de irrealidades que nos ajudam a compreender o implícito?
- O Lidimismo rejeita a imitação superficial da modernidade, abarrotada de estímulos fugazes e vazios, e se esforça para comunicar ideias profundas por meio de expressões que transcendam o ordinário. Nessa busca, o movimento flerta com a concepção de múltiplas realidades encapsuladas em instantes singulares, onde conceitos abstratos como o tempo e a angústia se materializam em alegorias. Reminiscentes da estética medieval, mas infundidas com a vitalidade do realismo fantástico latino-americano, onde o irreal é algo não só possível, mas cotidiano, comum. A arte Lidimista é, portanto, inerentemente fantástica, mesmo em suas manifestações mais minimalistas, buscando sempre expandir o espaço para interpretações múltiplas.
- Nesta era pós-verdadeira, onde a linearidade do mundo foi definitivamente desmascarada como uma ilusão, a perspectiva na arte Lidimista é liberta de qualquer convenção: pode ser distorcida, inversa, atonal, esférica, não-euclidiana. Esta arte não busca apenas expressar, mas explorar, mergulhar nas profundezas da experiência humana e extrair dela um significado que ressoe com a complexidade de nossa existência atual. A Arte Lidimista, portanto, assume o papel de preencher as lacunas deixadas pela realidade incompleta, utilizando lógica, razão e ética para iluminar as sombras da condição humana, de maneira que ela sirva não apenas à arte pela arte, mas um propósito social mais amplo. Ela não deve ser óbvia, pois, mais do que expressão, a arte também deve ser exploração e essa é a marca de uma Arte Lidimista.
- Ela tem em vista demonstrar a dimensão dos temas cotidianos sob lentes tanto naturais quanto mentais, assim como a ciência visa demonstrar a dimensão de nosso planeta a partir de uma perspectiva exterior — um esforço para compreender plenamente nossa existência, que seria impossível se nos limitássemos a olhar apenas do ponto de vista de nossa própria superfície. Reforço: hoje a realidade é incompleta; cabe à arte usar a lógica, a razão e a ética para preencher essas lacunas e servir a um espectro maior, social. A arte deve demonstrar a dimensão dos temas cotidianos sob os prismas naturais e da mente, assim como a ciência deve demonstrar a dimensão do nosso planeta, visto de fora dele mesmo, caso contrário, nunca teríamos a plena compreensão dele, vivendo sobre sua superfície e olhando para suas paredes.
- A ciência e a tecnologia, quando utilizadas com um espírito humanitário, são forças poderosas que promovem o progresso e a compreensão. No entanto, nas garras de déspotas, tornam-se instrumentos de opressão, dilacerando o véu da privacidade e subjugando vidas ao controle autoritário. A criptografia, os contratos inteligentes e outras inovações emergentes se tornam, então, ferramentas vitais na salvaguarda da integridade e da autenticidade da expressão artística. Eles nos permitem proteger a arte das garras da censura e garantir que as mensagens críticas que ela carrega sobrevivam às tentativas de supressão.
- Garantir a autenticidade do seu trabalho e colaborar com a análise lógica de especialistas no futuro é importante. A importância da arte transcende o estético; ela é um testamento da época de sua criação, um reflexo das mãos e mentes que lhe deram vida. Proteger a arte significa proteger o diálogo contínuo entre o presente e o futuro, assegurando que as gerações vindouras tenham acesso à nossa era, com todas as suas complexidades e contradições. A Arte Lidimista pode nos levar a um futuro em que é possível viver todo o espectro da humanidade.
- Este manifesto, embora enraizado no seu próprio tempo, aspira a uma existência atemporal. É um chamado para que a arte se transforme e se adapte, resistindo e desafiando o fluxo implacável do tempo. Deve ser um documento vivo, evolutivo, um compêndio das lutas e triunfos da arte contra as adversidades. Um lembrete do poder da arte em períodos de dificuldade. Este manifesto é atemporal enquanto vivermos em um mundo de insanidades, enquanto vivermos tempos de abusos normalizados e esquecidos — refiro-me aos abusos humanitários e aos relacionados ao direito dos animais — e enquanto houver pessoas interessadas em algo melhor do que este mundo destruído, com humildade em relação à razão. Nos encontramos em uma era onde as insanidades são rotinas, onde a normalização e o esquecimento de abusos — sejam eles contra humanos ou animais — são marcas registradas de nossa sociedade. Este Manifesto é um grito por um futuro onde a racionalidade, a análise crítica e um humanismo profundo orientem nosso caminho em direção a um espectro mais pleno da experiência humana.
- A Arte Lidimista não deve se confinar às paredes das galerias, mas se espalhar pelas ruas, acessível a todos, especialmente ao povo trabalhador. Ela deve ser uma celebração da vida em todas as suas formas — amor, medo, ira, ódio — e se tornar a linguagem universal através da qual explicamos o intrincado, o complexo. Que ela capture o amor, o medo, a ira, o ódio; que seja popular.
- Sonho com o dia em que este texto será visto apenas como um eco de um passado distante, um lembrete de uma época em que a luta contra a ignorância e a superficialidade ainda precisava existir. Que ele sirva como uma recordação de nossos esforços para transcender a mediocridade e celebrar a profundidade e a riqueza da experiência humana. Que, no futuro, possamos olhar para trás, para os camaradas Lidimistas que nos precederam — aqueles que infundiram o movimento com sua arte, os que deram arte ao movimento, pois somos como um só. — e orgulhosamente proclamar: “Conseguimos”. Que este manifesto inspire não apenas uma reflexão, mas a ação em direção a um mundo onde a arte, em sua mais pura e revolucionária forma, sirva como o farol que nos guia para fora das sombras da ignorância e da conformidade.